Sistema e método de jogo
Futebol é tática: aceitem
Futebol é tática: aceitem
“O futebol não se traduz em termos técnicos e táticos, mas puramente emocionais”. Dizem que Nélson Rodrigues é o autor desta frase. Talvez ele não soubesse, mas com ela o grande cronista alimentou e influenciou duas ou três gerações de jornalistas e de torcedores – a dita opinião pública – que realmente acreditam nisto. Em geral, para nós o futebol é uma sucessão de eventos aleatórios comandados pelos astros e pelos corações. Dá uma bela crônica, e Nélson Rodrigues é o pai dos cronistas. Mas futebol é um esporte tático.

Vocês dirão que somos pentacampeões – e somos, mas sempre liderados por grandes craques. É disso que a gente gosta: futebol é individual, é plástico, é estético e é emocional. Não quero, vejam bem, retirar do torcedor essa relação platônica e irracional com o esporte. Mas aos profissionais envolvidos com os processos – jornalistas também, ou ainda, principalmente – é preciso entender o jogo.

Futebol se traduz sim em termos táticos e técnicos. Desculpa discordar do grande mestre nacional. Futebol é OCUPAÇÃO DE ESPAÇOS. É, nos treinos extremamente complexos e elaborados, estimular os jogadores a tomarem as decisões certas dentro de campo, indicando a eles ONDE ESTAR, PARA ONDE IR E QUE FAZER QUANDO CHEGAR LÁ a cada fração de segundos.

Não lhes parece que é exatamente isso o que a Alemanha fez conosco? Ocupou os espaços certos? Sempre tinha um cara livre, no mínimo, não é? E quando ele recebia, mais outro livre? E quando o adversário pegava a bola, não encontrava ninguém para passar, correto? Espaços certos ocupados com inteligência. Desculpa, Nélson. Mas não dá mais para brincar de tragicomédia. O troço é sério.

Rapidamente, alguns frames. Primeiro, a ocupação de espaços defensivos da Alemanha. A distribuição sem a bola era no 4-1-4-1, a LINHA DE ÔNIBUS ironizada pelos emocionais. Mas isso não é o mais importante. Reparem a distância ÍNFIMA entre os setores. Temos o que, ali…uns dez metros de distância entre zaga e meio-campo? Menos, até. Isso se chama COMPACTAÇÃO. E dá para ver a distância entre uma ponta e outra do bloco…o ESTREITAMENTO: todo mundo no setor da bola. Nove jogadores em um quadrado que não deve ter mais do que dez metros em cada lado. É difícil sair dessa, precisa ter um plano muito elaborado para combater tal marcação:





Com a bola, o plano deles foi bem claro: ocupar espaços às costas dos laterais e dos volantes brasileiros. Geralmente, a jogada iniciava no meio para terminar no lado e voltar para a área. Vejam aqui como Khedira tira Luiz Gustavo da frente da área (movimentou para não receber, e sim para ABRIR UM ESPAÇO IMPORTANTE, desorganizar o adversário de forma inteligente). O outro volante, Fernandinho, está auxiliando Marcelo a combater Müller. O que acontece? Linhas de passe abertas na frente da área brasileira. Kroos e Ozil livres:








Como o Brasil joga com a “saída de três”, que já expliquei aqui – com a bola, Luiz Gustavo vira zagueiro e libera os dois laterais – a Alemanha contra-atacava com extrema inteligência. Como eu disse, começava a ação pelo meio (onde Luiz Gustavo não estava pelo recuo) atraindo os olhares das camisas amarelas, e de imediato acionando um dos pontas às costas dos laterais – em geral Müller na direita. Vejam a recuperação da bola da Alemanha neste frame: três jogadores livres para atrair olhares no corredor central, e Müller disparando para sair na cara do Dante no 1×1 contra zagueiro às costas de Marcelo, que atacava.






Ter a bola, ocupar espaços no campo ofensivo, OFERECER LINHAS DE PASSE é o caminho, acredito, não apenas para fazer gols, como também para não sofrê-los – tendo, é claro, jogadores com inteligência de jogo e qualidade técnica (bem estimulados nos treinos) para executar. Aqui no Brasil o tiki-taka espanhol é vítima de combate e ironia, mas a Alemanha fez o mesmo que a Espanha. O tiki-taka não morreu, só mudou de camisa. Olhem esta sequência:

Schweinsteiger IDENTIFICA o grande espaço entrelinhas do Brasil. O que ele faz? MOVIMENTA-SE ATÉ LÁ (ou seja, é preciso saber onde estar, para onde ir e o que fazer). Três segundos depois, o frame seguinte mostra que ele recebe o passe livre. Mas notem ainda que o Khedira, que estava marcado lá na direita, fez o mesmo – identificou o mesmo espaço e movimentou-se até lá. O homem da bola tinha duas linhas de passe abertas entrelinhas, podendo escolher qual a melhor. É assim que se mantém a bola: movimentos curtos, nos espaços certos. Movimenta, recebe, identifica o espaço, movimenta de novo, e assim vai…





Para fechar, vejam como futebol É TREINO, É ESTUDO, É REPETIÇÃO. O 4º gol sofrido foi um bote sobre Fernandinho. Mas nada casual. Até deixei no frame abaixo o reloginho da tevê mostrando que aos 5 minutos, quando estava 0×0, a Alemanha JÁ ENSAIAVA a roubada sobre Fernandinho.

Sabedores da saída de três, Khedira subia a pressão em Luiz Gustavo (marcando ele e o zagueiro mais próximo ao mesmo tempo), Klose fechava o outro zagueiro, Muller e Ozil acompanhavam os laterais, e assim induziam a bola a entrar em Fernandinho, que IMEDIATAMENTE era pressionado duplamente por Kroos e Schweinsteiger. Ensaiou uma, ensaiou duas, concretizou na terceira:



Não quero tirar a emoção do torcedor. Mas futebol é um esporte tático. Puramente de organização, treino e inteligência. Aceitem, que dói menos.

Autor: Eduardo Cecconi
Academia de Futebol
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