Professor João Jerónimo
35 Anos
Residente em Cantanhede - Coimbra
Licenciado em Educação Física desde 2002
Treinador de Futebol - Nível II
Experiência como Treinador e Coordenador no Futebol de Formação e Treinador Adjunto/Preparador Físico no Futebol Sénior em clubes como: Grupo Desportivo Tourizense; Associação Desportiva Nogueirense; Clube de Futebol “Os Marialvas” e Febres Sport Clube.
Atualmente não desempenha funções em nenhum clube
Contacto: 915703931
E-mail: jpjeronimo@sapo.pt
1ª Futebol de Formação, qual a tua opinião sobre o que tens vivenciado?
Nuno se me permites, primeiramente gostaria de fazer uma pequena abordagem sobre o Futebol de Formação e, de seguida responderei à tua pergunta mais em concreto.
Começo por dizer que o grande problema de todo o futebol português começou quando a Formação deixou de ser o caminho. E agora o “bonito” discurso, por parte dos presidentes dos clubes, de que “vamos ou temos de apostar na formação” só surgiu, e sublinho tardiamente, por necessidade, porque a crise financeira lhes bateu duramente à porta e os levou ao abismo/falência financeira. Senão vejamos um exemplo bem conhecido por todos nós: O Sporting Clube de Portugal foi o primeiro a olhar para dentro, tendo em conta que a crise quase o levou à rotura total e assim foi “forçado” a olhar para a excelência da sua formação. Diga-se que o fez muito bem e mesmo a tempo! Mas só agora perceberam que tinham uma excelente formação? Não certamente. Por vezes, temos de passar pelas dificuldades para perceber qual a solução. Mas depois também pergunto: E se não tivesse havido essa crise? Fica a pergunta para futura reflexão.
No meu ponto de vista, "O Futuro não é algum lugar para o qual estamos indo, mas um lugar que estamos criando...". Posto isto, falar de Futebol de Formação ou Futebol Infanto-Juvenil é fundamentalmente falar do futebol de amanhã, dos Homens de amanhã. Ou seja, se queremos para “amanhã” um futebol evoluído, em constante aperfeiçoamento, com melhores jogadores, melhores Homens, melhores equipas e melhores resultados, então o trabalho tem de ser feito (bem feito!) já “hoje”.
Devo dizer, que apesar de haver sinais de mudança notórios nestes dois/três últimos anos e alguns até já estão a dar frutos no presente, julgo também que nos próximos anos ainda há muito por fazer no que se refere ao que deve ser o Futebol de Formação no nosso país. Passando pela própria Federação Portuguesa de Futebol e suas Associações, ao estruturar os campeonatos de futebol (nacionais e sobretudo distritais), pelas mentalidades completamente “ultrapassadas” e “falta de paciência” por parte dos clubes e dos seus intervenientes mais diretos, nomeadamente presidentes, diretores, treinadores, encarregados de educação/pais, e em alguns casos, dos próprios atletas. E terminando, nas oportunidades concedidas aos jovens atletas na equipa principal e à forma adequada da transição de atletas do Futebol de Formação para a alta competição.
Relativamente à tua pergunta, ora vejamos então alguns exemplos do que tenho realmente vindo a assistir e vivenciado no nosso Futebol de Formação e que condeno por completo. Posso afirmar que há ainda clubes em que a sua formação é vista apenas como receita para o próprio clube e não como formação/educação de crianças/jovens para o futuro. Como por exemplo, o dos meios humanos (corpo técnico), que no meu entender é uma parte fulcral num projeto de Futebol de Formação, é que o gasto de um clube num treinador de seniores não é o mesmo para com o treinador de formação. Na totalidade dos clubes a opção rege-se pelo mais barato ou até mesmo de borla/carolice e, pior ainda, muitas vezes sem qualquer tipo de formação e habilitação para educar/ensinar crianças/jovens. Em jeito de brincadeira, se tiveres um Ferrari mas não o souberes conduzir não te serve de nada certo? É o que se passa no futebol de formação por esses campos fora. Ou ainda, porque os clubes acham que um treinador de seniores será a melhor pessoa para treinar a formação. Só porque treina os seniores, neste caso homens adultos e, por isso será muito fácil treinar crianças/jovens. Também se pode dar o caso de ser o próprio treinador precisar de “ganhar mais uns trocos” e então conciliar as duas coisas! Ou por outro lado, querer ser o próprio treinador da formação a “aproveitar-se” dos êxitos desportivos, porque até tem “um grupinho jeitoso”, para poder, como ouço dizer, “dar o salto” o mais rápido possível e ir treinar uma equipa sénior! Tudo porquê? Só porque nos seniores recebem mais dinheiro ou porque a “tal” visibilidade é maior. Isto, no meu ponto de vista é um grande erro no Futebol de Formação. Porque tem de ser um treinador de seniores melhor que um treinador da formação? Desde sempre ouvi dizer que “cada um é como cada qual” ou “cada pássaro no seu galho”, não devendo, por isso, haver qualquer tipo de comparação entre eles e a cada treinador deve ser dada a devida importância, o devido valor e respeito pela função que desempenha no clube. Mas no que diz respeito a esta problemática, até me apetece citar o que afirmou em tempos o prestigiado professor José Curado: “Os melhores treinadores devem estar na formação.”
Acho importante salientar, que existem cada vez mais treinadores na formação com formação e habilitação. Todavia, ainda existem alguns sem qualquer tipo de formação ou habilitação, e até mesmo jeito e sensibilidade, para estar à frente de crianças/jovens. Devo dizer que conheci e trabalhei, infelizmente, com treinadores da formação em que a sua ambição era totalmente desmedida e irresponsável, colocando em risco todo o trabalho efetuado e o próprio futuro das suas crianças/jovens! O treinador da formação não pode querer "ganhar a todo o custo" para sua satisfação pessoal! Deve ter a noção de que mais importante do que ganhar sempre... É jogar sempre para ganhar! E que o bom espírito desportivo nunca deva ser sacrificado pela vontade “cega” de ganhar. O treinador da formação não pode nem deve, de forma alguma, colocar os seus objetivos pessoais à frente dos objetivos individuais e coletivos das suas crianças/jovens. Para finalizar, deixo o meu lema no Futebol de Formação: “Mais do que ganhar…o importante é educar, formar e jogar!”
2.ª Como surgiu o projeto da formação do Febres?
Primeiramente e, viajando um pouco atrás no tempo, devo dizer que sou natural de uma localidade chamada Fontinha, que pertence à freguesia de Febres, onde sempre residi diariamente ou mesmo ao fim de semana, enquanto tirava a minha Licenciatura. Porém, de há meio ano para cá passei a residir em Cantanhede. Depois, enquanto atleta (ao longo de 10 anos), entre outros clubes, também fiz parte dos quadros do Febres Sport Clube, quer como jogador da formação quer dos seniores. E portanto, conhecia bem o clube e as pessoas que o presidiam ou dirigiam e vice-versa. Quer como pessoa quer pelo que eu poderia acrescentar ao clube, pela minha formação (13 anos de docência e quase outros tantos de treinador) e habilitação profissional, aliado à minha experiência no Futebol de Formação em vários clubes, já referidos anteriormente.
Agora sim, respondendo mais em concreto à tua pergunta, o projeto da formação do Febres surgiu a partir de um convite por parte do agora presidente do clube e de um amigo de longa data que na altura fazia parte da direção. Esse convite foi feito, estava eu a desempenhar as funções de treinador adjunto no Clube Futebol “Os Marialvas”, no final da época 2011/2012. Ao qual eu aceitei de imediato, não pelo dinheiro, mas pelo enorme desafio que me esperava e que julgo ter superado da melhor forma. Bem como por entender ser uma mais-valia e querer dar ao clube uma formação digna do seu historial e que já tinha tido há uns anos atrás, mas que deixou infelizmente “morrer” como tantos outros clubes. Portanto, o trabalho seria começar praticamente do zero. Foi-me proposto treinar um escalão de formação, os Benjamins, e coordenar a (pouca) formação existente na altura. E é nesse sentido que entra o projeto de futebol da formação do Febres Sport Clube. Este assentava, sobretudo em 3 vertentes que eu considerava fulcrais para o seu desenvolvimento: possibilitar a todas as crianças/jovens a possibilidade de praticar futebol como um desporto de recreação e tempo livre; utilizar as aprendizagens da prática do futebol para uma formação integral da criança, a aquisição de hábitos de educação, higiene e estudo, que lhe possam ser úteis no futuro como membro ativo da nossa sociedade; detetar, formar, desenvolver e projetar jovens jogadores, a longo prazo, de maneira a criarmos bases para as futuras equipas do escalão sénior.
Nesta fase, contávamos apenas na nossa formação com cerca de 15 atletas inscritos, distribuídos pelos escalões de Benjamins e Infantis. Posto isto, coloquei mãos à obra, implementando as minhas ideias e trabalhando incansavelmente, de noite e de dia, em prol do Febres Sport Clube, na procura de crianças e jovens que gostassem de jogar futebol. Ao final da época 2012/2013, a formação do Febres Sport Clube já era composta por cerca de 30 atletas inscritos, distribuídos pelos escalões de Benjamins, Infantis e alguns Petizes e Traquinas. No final da época 2013/2014 estaria composta por cerca de 60 atletas inscritos, distribuídos pelos escalões de Petizes, Traquinas, Benjamins e Infantis. E até finais de dezembro da época 2014/2015, data em que eu entendi demitir-me de todas as funções no Febres Sport Clube, a sua formação já era composta por 100 atletas inscritos na Associação de Futebol de Coimbra, distribuídos pelos escalões de Petizes, Traquinas, Benjamins, Infantis e Juvenis e com idades compreendidas entre os 4 e os 16 anos. E portanto, entendo que o trabalho realizado ao longo destes 2 anos e meio que estive no Febres foi bem visível e fica um balanço bastante positivo. Eu acredito que tudo na vida é possível…basta acreditar no sucesso com trabalho! E foi nisso que eu sempre acreditei, ao longo da minha vida, e continuarei sempre a acreditar.
3ª Queres comentar a tua saída do Febres?
Sobre a minha saída do Febres Sport Clube, eu não gostaria de me pronunciar ou alongar muito sobre o assunto. Porque ainda me causa muita tristeza e mágoa pela forma como as coisas se foram desenrolando até ao desfecho que se tornou inevitável. Assim sendo, foi no dia 23 de dezembro de 2014 que dei por terminada toda a minha ligação, ao Febres Sport Clube, como coordenador e treinador do futebol de formação e como treinador adjunto/preparador físico da equipa sénior. Saí do Febres Sport Clube porque entendi que há valores que devem ser respeitados e transmitidos às crianças/jovens e praticados entre colegas de trabalho, sempre que possível através do diálogo e nunca de ofensas verbais e nem muito menos físicas, para com a minha pessoa, como foi o caso. Na minha opinião, como pessoa e como coordenador/treinador, considero e irei sempre considerar, inadmissíveis e imperdoáveis determinadas atitudes e posturas violentas que se verificaram para comigo, da parte de um treinador/colega de trabalho, em frente a dezenas de crianças/jovens e dos próprios encarregados de educação/pais e/ou familiares, bem como, considero ainda que é miserável, nem uma reprimenda ter sido feita da parte da direção a esse mesmo colega. Perante tudo isto, entendi que sem respeito por mim da parte desse treinador/colega e por não partilhar desta forma de trabalhar no Futebol de Formação, não havia mais condições para continuar e resolvi colocar o meu lugar à disposição imediatamente.
4ª Farias alguma coisa diferente?
Não. Como já referi anteriormente, foram 2 anos e meio a trabalhar afincadamente e com toda a dedicação necessária, sempre em prol das crianças/jovens do Febres Sport Clube. Posso dizer que fiz aquilo que mais gosto, com aqueles que ensinei, com os quais enriqueci e aprendi muito e isso ficará para sempre comigo. Não me arrependo de forma alguma. Umas vezes perdendo, outras ganhando e outras ainda empatando, mas sempre com o intuito de fazer melhores Homens, melhores atletas, melhores jogadores, melhores equipas e os melhores resultados possíveis. Posto isto, considero ainda que, enquanto estive no Febres Sport Clube, fui sempre um educador/formador/treinador de crianças/jovens e que contribui/fui responsável por alguma Educação e Formação Pessoal destas mesmas. Não houve ninguém, nesses 2 anos e meio que lá estive, que defendesse e gostasse mais do Febres Sport Clube do que eu. Foi, é e será sempre o clube da minha terra e do meu coração. Se ficou alguma coisa por fazer? Foi sempre minha intenção, desde o início do projeto, que o Febres Sport Clube estivesse representado em todos os escalões da formação, desde os Petizes até aos Juniores, nos próximos 5 anos após a minha chegada e tenho a certeza que ao fim de 3 anos esse objetivo estaria cumprido. Infelizmente não me deixaram condições ou margem para o poder concretizar e é o que mais tristeza me deixa, juntamente com o ter deixado as “minhas” crianças/jovens que só precisavam de uma bola nos pés para serem felizes.
5ª Estás recetivo para voltar a treinar na formação?
Claro que sim, sempre que algum clube possa precisar de mim, que as pessoas respeitem e valorizem sempre o meu trabalho e eu acredite nesse mesmo projeto. Ser treinador já faz parte da minha vida há muitos anos e gostaria de poder continuar a sê-lo. Adoro trabalhar com crianças e jovens, não colocando de parte os seniores. Para mim faz todo o sentido que o treinador de crianças e jovens, o designado treinador da formação…acredite no seu treino e na formação das suas crianças e dos seus jovens, independentemente do resultado final. E eu acredito bastante nisso. Acho que ainda tenho muito para dar ao futebol e acredito que, brevemente, isso acontecerá, sendo apenas uma questão de tempo.