Crônicas de Comentadores
O regresso dos mortos vivos
Crónica do FC Porto - Benfica
O regresso dos mortos vivos
Os dragões ressuscitaram nas últimas três jornadas. Depois de uma morte anunciada os portistas sobreviveram e agarram a primeira posição. A partida contra o Benfica foi como uma sinopse da época, a equipa esteve atrás e assumiu a liderança do encontro na fase final do mesmo. Isto é mais do que fé, que nas últimas jornadas já parecia ter desaparecido, isto foi a demonstração da responsabilidade e profissionalismo. Os azuis-e-brancos já estavam descrentes quanto à possibilidade de o Benfica perder pontos, mas nunca deixaram de vencer as suas partidas, não havia esperança mas havia uma obrigação. Foi assim desde a jornada 21, quando os dragões empataram em Alvalade, mas acima de tudo a partir da 23ª jornada no empate na Madeira com o Marítimo. A equipa deixou de depender de si mesma mas nunca abdicou, primeiro de ter fé, e depois de ter dignidade. Esta última palavra representa o trajecto do FC Porto este ano, foram sempre dignos, mesmo quando as coisas não corriam bem, só assim se justifica que na jornada 29 não tenham qualquer derrota e tenham conseguido dar a volta a uma situação que parecia impossível. Podemos dizer que não é só mérito dos dragões, outros contribuíram, mas só ganhando sempre desde a jornada 23 poderia tornar possível a liderança na liga, e aí não falharam. Destaque para Vítor Pereira que foi sempre a imagem do grupo, nem sempre bem é certo, mas que demonstrou orgulho, dignidade e profissionalismo, algo que nem sempre lhe tem sido retribuído nem pela comunicação social, nem pelos próprios adeptos. 

Tacticamente
O jogo tacticamente decorreu conforme o esperado, domínio portista exercido através de uma pressão alta. O Benfica tentou as transições ofensivas rápidas, tentando explorar a mais-valia do seu sector atacante. Como tem sido hábito nos jogos entre estes dois rivais, a forma de jogar azul condiciona e muito a produção atacante encarnada.
Uma primeira parte onde o domínio do FC Porto não resultou em muitas situações de golo, mérito do Benfica na forma como se protegeu entrelinhas, com especial incidência para a marcação ao homem dos alas encarnados aos laterais azuis. Uma forma de marcar que desgastou Ola John e Sálvio, tirando-lhes frescura física para as acções ofensivas. Mesmo com as equipas encaixadas a primeira parte ainda teve dois golos, tentos obtidos de forma afortunada, mas que teve como base jogadas estudadas da equipa. O golo de Lima resultou de um ressalto após um lançamento de linha lateral, a bola parada em que os encarnados são mais fortes a seguir às grandes penalidades. O FC Porto empatou sete minutos depois através um autogolo de Maxi Pereira/Artur, depois de uma das jogadas tipo dos portistas, cruzamento rasteiro de Varela para a zona que fica entre os defesas e o guarda-redes, que o uruguaio interceptou colocando a bola na direcção da baliza. Artur tentou corrigir a sua abordagem ao lance, mas só conseguiu confirmar o golo adversário.
A segunda parte começou da mesma forma mas com um Porto mais intenso. As alterações estratégicas começaram a surgir aos 66 minutos, com a entrada de Roderick para o lugar de Gaitán. Uma substituição que definiu de uma forma ainda mais clara a estratégia de Jorge Jesus, segurar o empate abdicando do jogador mais criativo dos encarnados, subindo Enzo e colocando Roderick ao lado de Matic. Uma mudança extremamente arriscada, a equipa perdia criatividade e defensivamente ganhava pouco. Mas JJ não se ficou por aqui, lançou Cardozo no lugar de Lima. Mais uma alteração defensiva, Cardozo só faz sentido em jogos com muita posse de bola e apoios, algo que o Benfica não tinha, portanto a sua entrada visava, uma vez mais, reforçar aspectos defensivos como as bolas paradas. Se o treinador encarnado quisesse refrescar o ataque podia ter optado por Rodrigo, potencialmente capaz de fazer estragos com a sua técnica e velocidade sem precisar de muitas ajudas. Enquanto isso Vítor Pereira tinha dúvidas nas alterações a fazer, fazendo a primeira mexida aos 72 minutos por lesão de Fernando. Defour foi o eleito e ocupou a posição do brasileiro, uma substituição que não produziu diferenças estruturais. Só aos 78 minutos o esquema foi alterado com a entrada de Kelvin para o lugar de Lucho. James passou a dar apoio a Jackson à frente de Moutinho e Defour e Kelvin foi para a esquerda passando Varela para a direita. O FC Porto aumentava a capacidade ofensiva enquanto o Benfica a reduzia, mas a partida não produzia grandes alterações e o tempo ia passando. Aos 83 minutos Aimar rende Ola John, uma substituição que deslocou uma vez mais Pérez, desta feita para a ala, perdendo o colectivo velocidade e ganhando experiência, a única característica que neste momento o argentino consegue dar. Os azuis-e-brancos respondiam com a entrada de Liédson para o lugar do lesionado Danilo um minuto depois. Era risco total numa substituição que fez os dragões perderem a posse de bola, retirando à equipa iniciativa. Foi nesta altura que os encarnados controlaram a partida e pareciam ter o objectivo inicial alcançado, o empate. Só que o futebol é fértil em surpresas e os erros pagam-se caro. Com o Benfica instalado no meio campo portista Varela recupera a bola e endossa-a para Kelvin sobre a esquerda, que arranca e tabela com Liédson que devolve de primeira e permite ao jovem brasileiro um golo de belo efeito num remate cruzado ao ângulo inferior esquerdo da baliza de Artur. Destaque pela negativa para Maxi, que foi “à queima” na primeira acção de Kelvin ficando fora do lance e permitindo ao brasileiro que se deslocasse para a área sem marcação. A compensação de Roderick chegou atrasada e a infantilidade do uruguaio pode ter custado um título, estávamos nos 91 minutos.
Individualmente destaque para o autor do golo da vitória, que marcou um excelente golo e, caso o FC Porto seja campeão, ficará de forma indelével ligado à conquista com dois golos decisivos numa fase adiantada da prova, primeiro contra o Braga, onde ainda fez o terceiro, e agora contra o Benfica. Também Varela esteve num patamar elevado, sendo o jogador portista que mais desequilíbrios criou aos encarnados. No Benfica destaque para Gaitán, desde muito cedo se percebeu que o perigo das águias só poderia vir dali, a sua técnica individual e a capacidade de passe eram um perigo constante para a defesa subida do FC Porto.
Com este resultado os dragões ficam a depender só de si para conquistarem o título, basta fazerem o mesmo resultado do Benfica na última jornada. Uma vantagem importante mas que não é clara, a excelente temporada do Paços de Ferreira obriga a cautelas, ainda para porque jogam sem pressão, tendo já conquistado matematicamente o terceiro lugar. Quanto ao Benfica resta-lhe vencer o aflito Moreirense e esperar que os azuis-e-brancos não vençam os castores. Isto depois de jogarem na quarta-feira a final da Liga Europa, uma partida onde os encarnados precisam de exorcizar os efeitos deste clássico, que seguramente serão muito negativos.
Autor: Pedro Santos Pereira
Fonte: www.vantagemnumerica.pt
Comentador: Pedro Pereira